Curso da Vida – Prepare-se para viver melhor

Velhice tem mais a ver com o cultural do que com o individual

O que define um grupo são interesses, projetos, valores, códigos, ideais em comum. Alguém consegue unir a terceira idade nessas categorias?

Você vem fazendo aniversários ano após ano? Como a passagem do tempo te afetou? Você consegue localizar alguma linearidade nas mudanças ou mesmo identificar quais são essas mudanças?

Este texto é sobre esse tema. Uma provocação quanto ao valor da idade cronológica. A primeira coisa que se pensa quando se define o idoso é a idade cronológica, alguma faixa ou algum ponto de partida, em geral distante de quem avalia.

Quando se pergunta a alguém o que é um idoso a maior parte das respostas partirá para uma certa idade (60, 70, 75, mas pode ser uns 40 ou 50 para uma criança). Alguns responderão que não, que se é idoso de acordo com certas atitudes e comportamentos frente à vida. É uma resposta melhor mas, possivelmente, o politicamente correto afetou a tendência de se responder nessa linha (o politicamente correto é um fator importante em pesquisas tipo survey, pena que não reflita a realidade).

Aí está o cerne. Envelhecer se dá concomitantemente ao passar dos anos cronológicos, é verdade, mas se tornar “um velho” não tem tanta linearidade quanto a cronologia.

Envelhecer e se tornar velho são conceitos distintos. Envelhecer se passa com todos, todos os dias. É biológico, celular, hormonal — a nossa máquina individual tem seu tempo e função na natureza. É social — com o passar dos anos existem mudanças de papeis, profissionais, familiares, sociais. E é cultural — a nossa face pública muda, nosso corpo muda e passamos a ser percebidos de acordo com os significados que essa imagem tem na sociedade.

Curiosamente, o envelhecer não se dá da mesma forma na experiência individual.

A passagem do tempo como experiência individual subjetiva não tem correspondência com o passar dos anos. As pessoas podem até contar dessa forma, mas é mais porque alguns scripts de narrar a vida são tão automatizados na cultura que os repetimos, irrefletidamente.

“Ah, esqueci o endereço de novo… deve ser a idade”. Você falaria isso a um adolescente avoado? Tem gente que vive “velho” desde a adolescência. Tem gente que não se sente velho até que algum baque (uma queda, a perda da potência sexual, a inatividade econômica) mostre a ele que “os anos passaram”.

E isso tem a ver com o ciclo social da vida e não somente com o andar cronológico (ainda que quando se fala de grandes grupos eles possam ter certa correspondência).

Se perguntada, individualmente, a maior parte das pessoas com 50, 60, 70, 80, 90… se sente “com menos anos do que sua idade biológica”. Já se pesquisou muito isso e entre 60% e 80% das pessoas (dependendo da pesquisa e do grupo etário pesquisado) se sente “mais jovem” do que sua idade cronológica sugere.

Quem sugere? A Cultura. É na Cultura que encontramos os significados do que é ser Old (velho), Terceira Idade, Elder (idoso). E não é positivo. Por isso a importância de movimentos que (re)signifiquem a chamada Terceira Idade.

Foi assim com a mulher, com o negro, com os LGBTs. Tem que ser com o idoso.

Ainda mais em um mundo cada vez mais em transformação, onde as fronteiras comportamentais entre grupos etários (ou entre gerações) são cada vez menos significativas, ao passo que a diversidade de comportamentos intragrupos etários é cada vez mais significativa.

A velhice (e o que é velho) tem mais a ver com o cultural do que com o individual.

Individualmente, envelhecer não é tão difícil. As pesquisas mostram que se é mais feliz. Que se aceita mais. Os que se deprimem, que são pouco ativos, que não encontram novos papeis (econômicos ou não) não são a maioria.

Agora, envelhecer, culturalmente, é uma barra pesada. O olhar do outro. O tratamento do outro. Pesquisas mostram que a forma negativa como o olhar do outro (mais novo) é colocado sobre o mais velho afeta a própria percepção que o mais velho tem de si mesmo (Yoon, Skurnik e Carpenter, 2013). E esse tratamento é penosamente pejorativo e totalizante, transformando grosso modo todos que ultrapassaram uma certa barreira cronológica em “um grupo”.

O que define um grupo, resumidamente, são interesses, projetos, valores, códigos, ideais em comum. Alguém consegue unir a terceira idade nessas categorias? O que os “une” então?

A idade… o que não faz sentido… você percebe o problema?

Experiencialmente, o que mantém uma pessoa viva são seus projetos de vida, sua identidade. Se tirarmos isso dos nossos idosos, lhes tiramos a vida e fazemos com que a profecia de serem velhos se cumpra.

Se mantivermos os papeis que os idosos podem ter na sociedade não apenas lhes facilitaremos uma vida mais prazerosa e cheia de significados, mas também lhes afastaremos do estereótipo negativo da velhice como o lugar do não fazer.

Há uma história interessante no livro Mortais, de A. Gawande. Fala de um experimento em um residencial para idosos (uma evolução das casas de repouso). Nela, aos muito idosos foram dados bichos e plantas para cuidar. Algo simples. Mas que lhes daria uma responsabilidade cotidiana. Comparado com lugares que não fizeram isso, em um experimento clássico, 2 anos depois, as medidas de saúde e bem estar e mesmo os gastos com medicamentos, tudo isso melhorou nos idosos do primeiro grupo.

A resposta do autor para isso é simples. Viver necessita de propósito. E propósito não rejeita ninguém em idade alguma, nem mesmo aqueles em idades “muito avançadas”.

Fonte – medium.com/@maturitynow por Benjamin Rosenthal

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