Literatura, dança, teatro. As buscas de Antonia Loiola Corrêa, de 85 anos, pelas artes e pelo conhecimento não têm limites. Aos 70, lançou seu primeiro livro “Trapézio de Cristal”, e agora prepara o segundo. O “Girassol Dourado”.
“Faz 22 anos que fiquei viúva. Eu tinha um marido, namorado, companheiro, eu tinha tudo. Naquele momento minha vida mudou muito, fiquei no fundo do poço por quase seis anos. Não achava graça em nada. Até que fiz uma viajem para a Europa e, quando eu voltei, já vim com a cabeça mais aberta. Minhas amigas diziam: ‘você não pode ficar parada’. E pensei: a vida da gente tem que continuar”.
Antonia, que mora com a filha no bairro de Laranjeiras, Zona Sul do Rio de Janeiro, resolveu fazer um pouco de tudo a partir daí. Ela frequenta oficinas, um grupo na OAB, faz dança de salão e se formou no curso de Teatro. “Sou manequim profissional também. Faz dois anos que não desfilo, por causa da saúde”, explica.
Devido a um grave problema recente de visão, teve que reduzir sua produção literária, mas já voltou à ativa. “Estou até hoje lutando pela vida. Comecei a trabalhar com 14 anos, mas sempre tive vontade de estudar, de vencer, de ser alguém”, diz ela, que já escreveu 13 peças de teatro.
“Sempre quis ser poetisa. Ia escrevendo e guardando. Aos 70 anos, lancei o primeiro livro, na Academia Maranhense de Letras, na terra em que nasci; e no Rio fiz o lançamento na OAB”, conta.
Ela tem uma explicação para tanta determinação: “Tive uma infância feliz, uma vida feliz no casamento, fui muito amada e muito da força que tenho vem disso”.
Por conta de transferências de trabalho da família, Antonia morou em vários estados, mas o Rio de Janeiro foi o lugar das grandes viradas. Aonde ela resolveu voltar a estudar depois de 20 anos, no final da década de 70. Fez um curso de reciclagem e passou para o curso Normal, mas queria mesmo era fazer a faculdade de Direito.
A poetisa não avisou a ninguém que faria vestibular. Só contou para a família quando saiu o resultado: “Passei em 12º lugar entre 3 mil candidatos. Quando minhas filhas estavam se formando na faculdade, eu estava entrando. Terminei com quase 50 anos. Ainda trabalhei por dez anos na Vara de Família. Não queria ganhar dinheiro com aquilo, queria ajudar a fazer justiça. Como diz na linguagem do nordestino, eu sou ‘peituda’, gosto de desafios”.
Muito dessa vitalidade vem do que ela chama de ‘hobby’ preferido: fazer e conservar amigos. Em seu aniversário de 80 anos, reuniu quase 400 pessoas na comemoração.
Para ela, a situação do idoso no país ainda é muito difícil, especialmente para as pessoas que não são esclarecidas. “Porque velha não é a pessoa, é a cabeça”, conta, entre risos. “Ainda tenho muita coisa pela frente, especialmente porque não me sinto um fardo para ninguém”, afirma.
Sempre em movimento, nossa conversa com Antonia (de camisa rosa na foto, ao lado das amigas e do professor da oficina) aconteceu ao final da aula no novo grupo de que ela participa há quase dois meses, o “Potencial-Idades: Um Espaço para a Maturidade”, criado pelo transpsicomotricista educacional e gerontólogo, André Muniz. Ela integra a oficina Expressão, Pensamento e Comunicação, e já deixou uma boa impressão entre os novos amigos: “Antônia, desde que entrou, vem nos surpreendendo e chamando a atenção com exemplos de superação, conquistas e criatividade. Além de enriquecer os encontros com sua arte, em que apresenta poemas reveladores da sua percepção de mundo e história de vida”, destaca Muniz.
“Olhei para o céu, lá estavam,
Outras nuvens entrelaçadas,
Entre elas um anjo sorria
E com Asas azuis me abraçava”
Assim termina o poema “Anjo de Nuvem”, em que recorda a infância em Barra da Corda, aos nove anos. Ela havia perdido o poema quando era pequena e o reencontrou quando estava produzindo o livro.